Para que o Direito
seja aplicado, sempre nos foi ensinado que o Direito, como ciência, tem
metodologia própria, objeto e finalidade.
As normas
jurídicas legais, ao serem elaboradas pelo poder legislativo, estes devem
desenvolver um raciocínio técnico, jurídico e científico de forma que estas leis, num dado momento serão invocadas
pelo aplicador para solucionar casos reais.
Será nesse momento
de aplicação das leis que o aplicador intérprete deverá ter como missão
estabelecer um elo entre a letra da norma legal, muitas vezes distante da
realidade social, com as verdadeiras necessidades do caso concreto.
Para isso, antes
de buscar uma solução mais justa para o fato, deverá o intérprete aplicador
buscar orientação nas lições da Hermenêutica, com vistas a realizar a
interpretação e oferecer a melhor solução para o caso sub Júdice.
Daí a necessidade
de conhecer as técnicas e o processo de interpretação, bem como as lições da
Hermenêutica e também a relação do Direito com a Sociedade, a evolução
cultural, fatores importantes que fazem com que se busque a realizar a melhor
interpretação jurídica na busca da Justiça.
Neste trabalho foi
exposto, de forma sucinta e pouco aprofundada, diante da complexidade do tema, sobre o conceito de Hermenêutica e
interpretação e as formas de que o juiz busca ou deveria buscar para
interpretar e aplicar a lei.
Para entendermos
melhor o processo de aplicação da interpretação, trataremos sobre a
interpretação sistemática e histórica, sendo que, em tempos passado, não
admitia-se a existência de lacunas, na lei e, a interpretação era limitada,
severa e literal. Transcorreremos sobre a evolução desses pensamentos em que o
entendimento era de que as palavras da lei traduziam a vontade do legislador.
1. CONCEITOS DE HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E SUAS DIFERENCIAÇÕES
A ideia de que à hermenêutica, como
teoria da interpretação, cabe a tarefa de fazer compreender o sentido do
assunto encontra sustento na própria etimologia, a qual permite que se siga
três orientações: expressar, interpretar e traduzir, para distinguir-se
hermenêutica. Todavia, a última orientação é abarcada pelo sentido da
orientação interpretativa, uma vez que o tradutor esclarece ou faz
compreensível o pensamento que está em uma língua distinta, restando, destarte,
as duas orientações precedentes[1].
Hermenêutica, designa, sobretudo, a
capacidade natural do ser humano de compreender. Esta compreensão não deve ser
limitada aos textos, pois alcança igual tratamento em relação as pessoas. Na
verdade, a tarefa hermenêutica é sempre a transferência de um mundo ao outro,
desde o mundo dos deuses ao dos homens, e, por isso a expressão hermenêutica parece conservar uma
conexão semântica com Hermes, o qual dá publicidade à mensagem dos deuses do
Olimpo, transmitindo-as aos mortais, quer isto dizer que, não só as anunciava
textualmente, como também agia como intérprete, tornando as palavras
intelegíveis e significativas[2].
A hermenêutica estabelece critérios e
técnicas de interpretação. A hermenêutica representa a teoria, a interpretação,
a prática que se aplica os princípios da primeira. Não se confundem, embora,
por extensão semântica, ambos os termos possam ser usados indiferentemente.
A interpretação é feita, sempre,
conforme algumas regras e enunciados preestabelecidos; realizada de acordo com
regras de como interpretar regras jurídicas. O nome dado à ciência que estuda e
confecciona o repertório de enunciados a serem respeitados pela via
interpretativa é hermenêutica.
Segundo Martin Heidegger, a
Hermenêutica é o estudo do compreender. Compreender significa compreender a
significação do mundo. O mundo consiste numa rede de relações, é a possibilidade
de relações. Pode-se organizar o mundo matematicamente; pode-se conceber o
mundo teologicamente; pode-se interpretar o mundo como linguagem, que é o que
interessa ao hermeneuta. Então, o mundo se torna dizível, o mundo é convertido
na linguagem que nós utilizamos[3].
É comum a utilização dos termos
hermenêutica e interpretação como sinónimos; porém jurídica e tecnicamente
estes não se confundem. Tem –se que a hermenêutica jurídica vale-se da
Filosofia do Direito, já a interpretação, cabe determinar o sentido e o alcance
das expressões de direito, representando a aplicação da hermenêutica jurídica.
Pela hermenêutica jurídica é que se tem os princípios que conduzem a
interpretação, representando, a “ teoria científica da arte de interpretar”[4].
A diferença faz sentido posto que
hermenêutica e interpretação levam a atitudes intelectuais muito distintas. Num
primeiro momento, está-se tratando de regras sobre regras jurídicas, de seu
alcance, sua validade, investigando sua origem, seu desenvolvimento etc.
Ademais, embora essas regras, que mais propriamente poder-se-iam designar por
enunciados, para evitar a confusão com as regras jurídicas propriamente ditas,
preordenem-se a uma atividade ulterior de aplicação, o fato é que eles podem
existir autonomamente do uso que depois se vai deles fazer. Já a interpretação
não permite este caráter teórico-jurídico, mas há de ter uma vertente
pragmática, consistente em trazer para o campo de estudo o caso sobre o qual
vai se aplicar a norma[5].
Assim, a interpretação tem caráter
concreto, seguindo uma via preestabelecida, em caráter abstrato, pela
hermenêutica. Pode-se dizer que a interpretação somente se dá em confronto com
o caso concreto a ser analisado e decidido pelo judiciário. A hermenêutica, ao
contrário é totalmente abstrata, isto é, não tem em mira qualquer caso a
resolver.
2 . FUNÇÃO NORMATIVA DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
INTERPRETAÇÃO
E APLICAÇÃO
A interpretação
que interessa ao direito é uma atividade voltada a reconhecer e a reconstruir o
significado a ser atribuído, na órbita de uma ordem jurídica, as formas
representativas, que são fontes de avaliações jurídicas ou que tais avaliações
constituem o objeto[6].
O direito
disciplina condutas, impondo-se como princípio de vida social. O Direito leva
as pessoas a se ligarem, comprometendo-se entre si, obrigando-se mutuamente. A
expressão formal do direito é a norma jurídica. Prevê ela os modos de condutas
interessantes ao convívio social. O conjunto dessas normas é que denominamos ordenamento
jurídico. Há ou haverá normas para todas as condutas. Não existe relação humana
que não possa ser enquadrada pelo Direito.
Fontes de avaliações jurídicas são normas
jurídicas e preceitos a elas subordinados, colocados em vigor em virtude de uma
competência normativa apropriada. Objeto de avaliação jurídica, podem ser
declarações ou comportamentos, que se desenvolvem no círculo social
disciplinado pelo direito, enquanto tiverem relevância jurídica segundo as
normas e os preceitos em vigor: em particular, aquelas declarações e aqueles
comportamentos que tiverem, por sua vez, conteúdo e caráter preceptivo, como
destinados a determinar uma ulterior linha de conduta.
A interpretação
jurídica, assim entendida, é apenas uma espécie, talvez a mais importante, do
género denominado “ interpretação em função normativa”. O problema que
caracteriza esse tipo de interpretação é o de entender para agir ou, de todo
modo, para decidir, ou seja, para tomar posição em relação a preceitos a serem
observados, ou relativamente a dogmas e avaliações morais, ou a situações
psicológicas a serem levadas em conta.
A interpretação
aqui tem a função de desenvolver diretivas para a ação prática ou para uma
opção; e assim assume a tarefa de manter sempre em vida, mediante o
entendimento, as exigências de uma ordem da realização, e particularmente
assume a tarefa de conservar em perene eficácia na vida de uma sociedade
normas, preceitos e avaliações normativas, que são destinados a regulá-la ou a
servi-lhe de orientação.
A realização do
direito deixou de ser mera aplicação das normas legais e manifesta-se como o
ato judicativamente decisório através do qual, pela mediação embora do critério
jurídico possivelmente oferecido por essas normas, mas com ampla atividade
normativamente constitutiva, se cumprem em concreto as intenções axiológicas e
normativas do direito, enquanto tal[7].
Conforme as
palavras de Jhering: “ O direito existe para se realizar. A realização é a vida
e a verdade do direito é o próprio direito. O que realmente não sucede, o que
só tem existência nas leis e no papel, é unicamente um espectro do direito,
meras palavras e nada mais. Ao contrário, o que se realiza, como direito, mesmo
quando não se ache escrito nas leis, nem o poço e a ciência tenham ainda
conhecimento disso[8]”
O critério
normativo que uma qualquer fonte jurídica que venha ser interpretada se
proponha oferecer, para uma concreta realização do direito, só pode oferecê-lo
aí pela mediação da interpretação – a norma será tal como é interpretada – e
sobretudo que a interpretação, ao propor-se referir o sentido normativo dessa
fonte a ser interpretada às concretas exigências ou o mérito concreto do
problema jurídico a resolver, para que possa ser dele um critério adequado de
solução, traduzir-se-á sempre numa normativamente constituída concretização[9].
2.1.
INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E APLICAÇÃO
São diversos os
métodos de interpretação e vários os enfoques dados pela doutrina a essa
matéria. É absolutamente assente na ciência jurídica que a técnica de
interpretação das leis constitui uma síntese necessária de vários processos.
Assim, dentre os vários métodos a serem mencionados, não há que se dá
prevalência absoluta a um em detrimento dos demais. Um método pode ser mais
apropriado que outro num determinado caso concreto, mas poderá não sê-lo para
outro. Assim sendo, ao lado da interpretação gramatical, deve ser levada em
conta, por exemplo, a interpretação sistemática e histórica. A utilização
desses vários métodos deve sempre ser vista com esse cuidado[10].
O Direito Romano
surgiu de um longo caldeamento de gerações, dos costumes primitivos aos éditos
dos pretores e à jurisprudência dos jurisconsultos, à doutrina dos prudentes.
Com a revolução Francesa, buscou-se o
rompimento com todo o passado, inclusive com relação ao Direito Romano, o que,
na realidade, nunca foi obtido. O código Civil Francês, de 1804, pretendia
bastar-se por si, proibindo-se qualquer forma de interpretação, o principal
fator do dinamismo do Direito Romano. A escola da exegese[11],
surgida com a codificação francesa, que abraçou essa corrente, não admitia a
existência de lacunas e a interpretação era limitada, severa e literal.
Pretendia-se exclusivamente ao texto da norma. O método exegético puro reduzia
a tarefa do jurista ao comentário do Código artigo por artigo. Para essa
escola, as palavras da lei representavam a vontade do legislador. Esse
liberal-individualismo, nos seus primórdios, prendia-se exclusivamente ao texto
da lei, fazendo do juiz um aplicador frio e autómato. Defendia-se essa posição em
nome dos direitos individuais que surgiam na época, na realidade, defesa dos
direitos patrimoniais. Com isto, abandonou-se o costume como fonte. Os fatos,
porém, jogaram por terra esses princípios, impossíveis de serem aplicados de
forma exclusiva[12].
A escola da
exegese entendia ser a lei, principalmente os códigos, a fonte suficiente do
Direito, nada deixando ao arbítrio do intérprete. Nunca se abandonou, contudo,
o método gramatical. Toda essa posição surgiu numa época em que se rompia com
os desmandos e privilégios da nobreza do Antigo Regime e era plenamente
justificável, como uma atitude de reação. Essa concepção literalista da
interpretação foi abandonada em breve tempo porque se mostrou, evidentemente,
contrária à natureza e às exigências da vida social.
Na Alemanha
desenvolveu-se, paralelamente à exegese, a já mencionada Escola Histórica, sob
a proeminência de Savgny. Sob seus desígnios, o Direito somente poderia ser
visto no curso da História. Importa examinar os reflexos da sociedade e não
somente o texto legal. Se, por um lado, o Iluminismo dos franceses apontava
para a razão, o Historicismo valia-se da imaginação, do sentimento e da
sensibilidade, para auscultar as necessidades sociais de cada época, como
manifestação espontânea. Os alemães só vieram a ter seu Código Civil em 1900,
fruto de elaboração científica e dos estudos dessa escola histórica. Esse
historicismo redundou num cientificismo exagerado, que encarava o Direito de
forma racional e universal e não como algo histórico e nacional. Posteriormente,
novamente com o positivismo, recrudescem o formalismo e o apego às formulas
legais e à codificação. Kelsen influenciou muito o século XX e escolas que se
seguiram, principalmente a que potencializava os valores[13].
Escolas mais
recentes admitiram o livre raciocínio do intérprete. Contemporaneamente, há que
se entender que as normas de direito são instrumentos práticos, que combinam
princípios de ambas as escolas e muito mais. Interpretar não é apenas
compreender o sentido gramatical da lei, mas também penetrar no seu sentido
mais profundo e em todo abstrato que está por detrás da norma. As normas não
são instrumentos positivos ou negativos, devendo ser aplicadas ao caso concreto
segundo certos valores para a boa aplicação do direito. Por outro lado, o
sentido da aplicação da lei deve adequar-se à sociedade. Estará fadada a ter
vida curta a interpretação não aceita de forma geral pela sociedade. Por isso
mesmo, o juiz tem certa liberdade de apreciação, subordinado à hierarquia
jurisdicional[14].
Não há como
aplicar sem interpretar. Não há como se aplicar o direito, qualquer direito,
qualquer norma, qualquer texto legal sem o interpretar.
A norma age sobre
a conduta por meio de uma operação intelectiva (interpretação), destinada a
proporcionar sua correta compreensão e a determinar a apreciação do
interessado: em outros termos, age mediante uma atividade destinada a fazer com
que ele saiba, quer ele se encontre ou não na condição ( hipótese de fato ou
espécie) prevista pela própria norma. A operação intelectiva, voltada a
verificar e controlar se recorrem no caso os pressupostos de fato da norma ou
do preceito, pode determinar, por meio de apreciação do interessado, a
observância da decretação desses pressupostos na sua conduta. As também pode
determinar uma apreciação de diferente e um conflito de apreciações entre os
dois ou mais interessados ( litígio), e, de todo modo, uma inobservância seja
objetiva ou observância subjetiva pela simples ignorância da norma[15].
Descrito o fato
social, cabe o hermeneuta diagnosticá-lo. Esse diagnóstico do fato levará em
conta todas as circunstâncias sociais que o cercam. Assim, examinará se
trata-se de fato ocorrido na zona rural ou urbana; se entre pessoas cultas ou
de pouca instrução; se sob pressões económicas ou psicológicas, em época de
fartura ou escassez etc. Todo esse quadro deverá ser transmitido pelas partes
envolvidas, quando não sabido como fato notório, cabendo ao juiz investigá-lo
mais ou menos profundamente, inclusive induzindo a produção de provas não
acenados pelos interessados[16].
Na etapa seguinte,
identificado e compreendido o fato, o aplicador buscará dentro do ordenamento
quais as normas aplicáveis, verificará se há hipótese normativa para o fato.
Trata-se do diagnóstico do Direito,
da busca do Direito aplicável ao caso concreto.
A seguir o
julgador passará para a crítica formal e substancial das normas escolhidas.
Examinará os textos legais, seus meandros, sua validade e sua aplicabilidade ao
caso concreto.
O juiz, ao
concretizar a norma, passa a ser o intermediário entre a norma e a vida. É,
porém, um aplicador do Direito, um executor da norma, embora materialize a
norma para o caso concreto, para as partes envolvidas, e não um criador de
normas[17].
Na etapa seguinte,
o juiz passará propriamente à interpretação, utilizando-se de métodos e
critérios aceitos, para concretizar a norma abstrata em norma concreta para a
situação sob análise.
O juízo não é a
tomada de posse de uma verdade, mas a expressão de uma relação social[18].
Portanto, essa
normalmente tem a sua premissa indispensável na interpretação, visto que a
compreensão correta também garante a aplicação correta da norma ao caso
concreto.
Na interpretação,
integração e aplicação das normas positivas, não procura a teoria crítica do
direito o que é melhor para o direito, ou para a ordem jurídica, mas vislumbra
o que é melhor para a sociedade[19].
3. O
DIREITO E A SOCIEDADE
O direito é um
fenómeno social, mas a sociedade tem objeto completamente diverso da natureza,
na medida em que é uma conexão de elementos inteiramente diferentes[20].
A vida social não
está organizada de forma inexorável, rígida. Em tudo que nos cerca, verifica-se
que existem homens e existem coisas. O
homem não apenas existe, mas coexiste, ou seja, vive necessariamente em
companhia de outros homens. Em virtude do fato fundamental da coexistência,
estabelecem os indivíduos entre si, relações de coordenação, de subordinação,
de integração, ou de outra natureza, relações essas que não se dão sem o
concomitante aparecimento de regras de organização e de conduta.
O Direito abrange
um conjunto de disciplinas ou sistemas de normas que exigem dos homens
determinadas formas de conduta. E o homem é obrigado a obedecer as regras de
direito porque assim o Estado o ordena.
O Direito exerce
basicamente três funções, as quais, no fundo, são os meios para atingir os fins parciais do Direito, para além da
Justiça: sentido do mundo, liberdade, paz social, ordenação, hierarquização,
segurança, etc[21].
Em uma definição
básica do Direito obtemos, em última análise, o fato de ser uma técnica social
específica de ordem coercitiva, que regula as relações sociais dos homens de
uma mesma comunidade.
A comunidade nada
mais é que uma ordem social que regula o comportamento recíproco dos seus
indivíduos. Indivíduos pertencentes a certa comunidade ou que formam certa
comunidade estão sujeitos a uma ordem comum que regula seu comportamento
recíproco.
Contudo, esta
relação social não é apenas regulada pelo que chamamos direito, mas também por
outras ordens sociais como a moral e a religião, estas últimas em várias
condições, auxiliando o direito na busca pela conduta prescrita pela norma
jurídica. Por exemplo: o Direito, a Moral e a Religião proíbem o assassinato.
Pelo Direito, se um homem cometer assassinato, estará submetido a uma sanção de
caráter coercitivo já prescrita pela ordem jurídica. A moral se limita a dizer:
não matarás. Já os religiosos ameaçariam o assassino com o castigo de uma
autoridade sobre-humana, vê-se nesta última ordem o seu caráter transcendental
e sua proximidade com o Direito[22].
Partindo do
pressuposto de que a ordem social busca o comportamento correto dos indivíduos
em relação às regras prescritas, acredita-se que, além disso, um dos objetivos
de toda a ordem social é a busca por uma relativa paz social em conjunto com
uma justiça concreta.
Não existem normas que
possam abranger e esgotar todo um inventário de situações a existir em uma sociedade.
Isso é ilusório, impossível de se
estabelecer, pois, o homem é um ser dinâmico e impreciso, fatos esses que
geram, sempre, situações novas, imprevisíveis na sua vida em sociedade.
Percebe-se que a interpretação jurídica possui, sem dúvida alguma,
importante função, pois a lei, por ser escrita, permanece, e, por isso,
necessita da criatividade e vivência cultural do intérprete no sentido de
adequá-la ao caso sub judice.
4. O
JUIZ, A EVOLUÇÃO CULTURAL E A JUSTIÇA
De tudo que se viu
e por tudo que se decanta em torno da interpretação e da aplicação das normas,
a figura do juiz e, consequentemente do
Poder Estado ao qual ele pertence é colocada em absoluta proeminência. Como
reiteradamente afirma a doutrina, é do Juiz e do Poder Judiciário a palavra
final para a materialização e concretização do Direito. A sentença transforma a
realidade e o destino das partes. O fato é que por tanto tempo essa posição vem
sendo repetida, que poucas vezes percebemos que nem sempre essa é a realidade
ou que essa não mais é ou deve ser a realidade constante.
O primeiro dever
do juiz ( intérprete) é analisar o dispositivo legal para captar o seu pleno
valor expressional. A lei é uma declaração da vontade do legislador e,
portanto, deve ser reproduzida com exatidão e fidelidade. Para isto, muitas
vezes é necessário indagar do exato sentido de um vocábulo ou do valor das
proposições do ponto de vista sintático[23].
A lei é uma
realidade morfológica e sintática que deve ser, por conseguinte, estudada do
ponto de vista gramatical. È da gramática , no seu sentido mais amplo, o
primeiro caminho que o intérprete deve percorrer para sar-nos o sentido
rigoroso de uma norma legal. Toda lei tem um significado e um alcance que não
são dados pelo arbítrio imaginoso do intérprete, mas são, ao contrário,
revelados pelo exame imparcial do texto[24].
Entretanto, Karl
Larenz, afirma que se o jurista quiser ser fiel a sua profissão, deve entender
o Direito positivo, no seu conjunto, como uma via, mas não a única via, de
realizar a maior Justiça possível[25].
Quando há um
atrito entre a Lei e o Direito, tem-se uma questão ética, um choque de valores.
As decisões valorativas não estão no domínio da lei, estão no domínio da Ética.
Entre dois valores – a Ética nos guia -, devemos decidir pelo valor de maior
hierarquia. Entre o culto da lei e o culto do Direito, o valor de maior
hierarquia é o culto do Direito.[26]
O
direito deve acompanhar a evolução cultural. Necessariamente o ordenamento
jurídico deve interagir-se com os acontecimentos sociais, visando a buscar a
realização de necessidades humanas reais. Há que se evitar o hábito persistente
de apresentar doutrinas e teorias jurídicas desligadas de suas condicionantes
sociais e políticas, para que não apareçam como puras construções do espírito
entre as quais é difícil escolher.
Não
há como cultivar o direito, isolando-o da vida, que, em nossa época, se
caracteriza pela rápida mobilidade, determinada pelo progresso científico e
tecnológico, pelo crescimento econômico e industrial, pelo influxo de novas
concepções sociais e políticas e por modificações culturais.
CONCLUSÃO
Pelo
que foi exposto, fica em evidência o papel do magistrado, maior intérprete da
lei, na busca da realização da justiça.
Em
tempos de constantes transformações políticas e ideológicas, onde países se
agregam unindo economias, em que regimes absolutistas extinguem-se, nações
liberam-se, a pobreza, a miséria e a fome espalham-se como uma verdadeira
epidemia, a violência invade lares e a evolução tecnológica atinge patamares
inimagináveis, o papel do magistrado é, sem sombra de dúvidas, difícil e árduo.
A sociedade se transforma, o direito, necessariamente, deve acompanhá-la.
Assim, o juiz deve estar preparado, jurídica e culturalmente, a
fim de que, possa realmente interpretar a regra jurídica e aplicá-la em
conformidade com os anseios da sociedade moderna. Para tanto, deve o magistrado
procurar soluções nos quadros cultural, político, econômico, social e jurídico,
afastando-se do conservadorismo da lei, sempre procurando alcançar soluções
mais próximas possíveis do que se chama justiça.
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[1] SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica Jurídica e
Concretização Judicial. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor. 2000; p. 45
[2] Idem, p. 49
[3] HEIDDEGGER, Martin. Ser e
Tempo. Tradução de Marcia Sá Cavalcante
Schuback. Rio de Janeiro: Ed. Vozes. 2005, p.205
[4] ANDRADE, Christiano José de. O problema dos métodos da interpretação
jurídica. São Paulo: RT, 1992.
[5] BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica
e Interpretação constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997.p. 21
[6] Betti, Emilio. Interpretação da
lei e dos atos jurídicos: teoria geral e dogmática; tradução Karina
Jannini. São Paulo: Martins Fontes Editora. 2007. p, 05.
[7] NEVES, Antonio Castanheira. O
actual problema Metodológico da Interpretação Jurídica – I. Coimbra, 2003;
p. 12.
[8] Jhering, Rudolf Von. O espírito
do Direito Romano- Nas diversas fases de seu desenvolvimento. Tradução de
Rafael Benaion. Editora Alba, 1943, p. 16.
[9] NEVES, Antonio Castanheira. O
actual problema…sic, p. 13.
[10] VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução
ao Estudo do Direito.2ª ed. SãoPaulo: Atlas, 2007, p. 179
[11] Exegese é termo que
significa interpretar um texto de lei ou grupo de normas em particular, uma
particularização de hermenêutica e, na linguagem figurada, pode também ser
utilizado como sinônimo de interpretação.
[12] VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução
ao …sic, p. 159.
[13] VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução
ao…sic, p.159.ss
[15] Betti, Emilio. Interpretação da
lei…sic., p. 9
[16] VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução
ao…sic., p. 160ss.
[17] VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução
ao … sic., 160ss
[18] BENSAID, Daniel. Quem é o Juiz.
Para acabar com o Tribunal da História. Instituto Piaget.,p.
[19] COELHO, Luiz Fernando. A Teoria
Crítica do Direito em Face da Obra de Jhering – Jhering e o Direito no Brasil (
Org. João Maurício Adeodato). Recife: Ed. Universitária.1996; p.161
[20] KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. [tradução João Baptista Machado]. 6ª ed. -
São Paulo : Martins Fontes, 1998; p. 02.
[21] CUNHA, Paulo Ferreira da Cunha. Filosofia
do Direito. Coimbra: Almedina, 2004, p. 122.
[22] José Raul Cubas Júnior. Direito
e Justiça. Análise a partir do pensamento de Hans Kelsen. Paz Social, absoluta
ou relativa – Matrizes dos Conceitos
de Justiça. ( coord. Lafayette Pozzoli, Vladimir Brega Filho. São Paulo:
Letras Jurídicas; 2010, p. 219.
[23] REALE, Miguel. Lições preliminares do Direito. Coimbra: Almedina,
1982, p. 275
[24] REALE, Miguel. Lições preliminares do…sic, p. 275.
[25] LARENZ, Karl. Metodologia da
Ciência do Direito. Trad. De João de Souza Brito e José António Veloso. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, p. 398.
[26] HERKENHOFF, João Baptista. Para
onde vai o Direito?. Reflexões sobre o papel do Direito e do Jurista. 3ª
ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2001; p., 68.